quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

EDUCAÇÃO SEXUAL RESPONSABILIDADE DE QUEM?

Educação sexual tem sido tema recorrente em conversar familiares, rodas de amigos, reuniões escolares, atendimentos psicológicos e psicopedagógicos, artigos publicados em jornais e revistas, seminários, programas de televisão... Uma das intenções de tantos encontros e desencontros é buscar a responsabilidade pela ‘assustadora’ educação sexual.
 Educação é a formação de conceitos e de valores através da transmissão de conhecimentos. Ela é construída concomitantemente à história de vida do indivíduo - desde o nascimento da criança, o que a liga diretamente à estrutura de personalidade; passando pelo grupo familiar – que determina algumas características, sendo que estas surgem de acordo com as interpretações dos pais às experiências do indivíduo; e depois no social – onde o indivíduo “testa” seus conhecimentos. É um processo de construção mente-corpo que visa o equilíbrio.
No processo educacional o ensinante permite a busca de conhecimento do aprendente e entrega os seus conhecimentos, permitindo a este simbolizar, guardar, mostrar e ressignificar seus conhecimentos. Juntos eles constroem a aprendizagem. E para que esta aprendizagem ocorra o ensinante deve ter algumas características, tais como: ser bem informado, respeitar o aprendente, transmitir confiança, ser aberto ao diálogo, entre outros.
 Sendo assim, o objetivo de toda educação deve ser a formação do indivíduo, devendo sempre gerar conscientização, liberdade e equilíbrio pessoal, propiciando qualidade de vida.
 Ao se discutir a necessidade da Educação Sexual nos deparamos com argumentos contra esta ação através de uma total negação não só da necessidade da educação sexual como da própria existência da sexualidade e/ou de uma negação camuflada por argumentos falsos, indiretos e/ou diretos, que são os que aceitam, mas não promovem a educação sexual. E, também, com os argumentos a favor: de ordem psicológica, social, clínica, educacional e profissional.
 No meio a tanta discussão sexual observamos a movimentação da educação sexual do âmbito repressivo para o permissivo.
 Saímos do modelo tradicional (repressivo) no qual a palavra chave é proibição, nada pode tudo é permeado pelo dualismo entre o bem (certo) e o mau (errado). Tem uma forte base na força moral, religiosa e cultural. A reprodução (gerar descendentes) é o objetivo único da sexualidade, existindo toda uma orientação fisiológica para isto. Sendo, então, a única função feminina a de reprodutora. A atividade sexual é considerada suja, pecado, doença, o que favorece a obsessão, pois não se fala sobre mas se faz escondido.
 Agora, nos encontramos no modelo permissivo no qual tudo é permitido. Há uma postura de oposição, mas não de conscientização da sexualidade. Mudam-se as atitudes e comportamentos, mas ninguém sabe o porquê. As palavras-chave são erótico, corpo e orgasmo.
 Com a atuante permissividade sexual não sabemos quem esclarecerá às crianças e adolescentes as freqüentes dúvidas sobre o que estão sentindo e vivenciando e a que estão expostos no dia a dia através da mídia.
 De que forma acreditamos estar educando quando na verdade estamos reproduzindo um modelo preexistente, ou seja, deseducando sexualmente?
 A atual educação sexual aborda dois principais pontos: informações biológicas (reprodução, gestação, menstruação, órgãos sexuais...) e as normas, moral e juízos de valor.
 Dentro deste contexto, mostra que a religião vem dominando a educação sexual, tratando a sexualidade pelo binômio puro – impuro, no qual a sexualidade pura seria aquela consolidada pelo matrimônio. Nesta linha de pensamento segue, então, a dessexualização do indivíduo, através da deseducação sexual e da repressão.  Já que a educação sexual é a reflexão sobre liberdade, responsabilidade, moral, afetividade, prazer e comunicação.
 Pode-se perceber a dificuldade dos adultos em aceitar que a sexualidade não se inicia com a vida adulta, faz parte da construção da aprendizagem humana, é o processo que possibilita a plena formação do indivíduo como indivíduo pleno. É um processo de desenvolvimento psicossexual (desenvolvimento físico, emocional, intelectual e sexual) que se dá desde a concepção do indivíduo.
 É também difícil o adulto aceitar que ele tem de rever a sua própria sexualidade para poder ensiná-la, pois ser educador sexual não é reprimir a sexualidade do educando, mas sim proporcionar-lhe meios de exercer sua sexualidade sem medo e sem culpa.

E quem seriam os outros educadores sexuais e de que forma vêm atuando?
 A Família está envolvida neste processo desde a concepção e deve iniciar o processo de educação sexual desde o nascimento da criança. Sendo, então, de responsabilidade primária da família a processo de educação sexual, devendo depois ser articulado com a escola e assessorado por esta, já que por ter a função de formadora, a escola deveria saber como continuar esta educação sexual da forma a desenvolver um indivíduo saudável.
 Os pais ensinam os filhos os valores sexuais da família, mantendo a tradição e gerando nos filhos dois sentimentos, o amor e o medo. Podemos, assim, distinguir duas funções da família na educação sexual: a repressão da sexualidade dos filhos e a manutenção do modelo ideal de comportamento sexual. Sendo que este modelo visa a aprovação social e segurança financeira (casamento) em detrimento do prazer e do amor.
 A Escola tem, evidente, a tendência de preservar a si mesma, seus métodos e normas vigentes, não valorizando o novo nem o diferente e não ensinando nada que provoque mudanças. Sua educação sexual é orientada para formação da família e remoção dos desejos. No dia a dia ela desqualifica a sexualidade e tolhe os comportamentos sexuais. Daí a sua denominação: dessexualizada e dessexualizante.
 Instala-se aí o ciclo de transferência da responsabilidade, no qual a família responsabiliza a escola e vice-versa e, ambas responsabilizam terceiros pela educação sexual. O papel da família e da escola parece que vem sendo o de ‘ensinar’ a reproduz o modelo; nunca repensar os modelos, o que levaria à mudança, inclusive na educação sexual.
 Um outro educador seria a poderosa mídia, que dita preconceitos e valores. Sendo a mídia a mais moderna babá eletrônica que ‘educa’ a todos apresenta, na grande maioria dos programas, apelo sexual, incitação à violência e ridicularização da pessoa, principalmente em horário impróprio para exibição. O que também não promove a crítica ao modelo, somente a reprodução do mesmo.
 Os educadores devem, então, se questionar: será que o que falamos condiz com o que fazemos e acreditamos sexualmente?
 Muitas vezes aceitamos conceitos preconcebidos a fim de mantermos a tradição da educação sexual. E, como a um hábito, nos acostumamos à repressão e conseqüentemente a não realização de nossos desejos, reproduzindo o modelo. E a reprodução sufoca a sexualidade transformando-a em genitalidade (sexo pela reprodução), o que como conseqüência se converte em uma vivência efêmera.
 O excesso de modelos, conceitos e métodos de educação sexual, porém não soluciona este problema nem dá alternativas para iniciar o movimento de mudança.       
Os educadores sexuais devem se questionar e avaliar para não incorrerem no erro de chamar de educação sexual o que na verdade é deseducação e, além de ter aceitado, continuar reproduzindo seus conceitos.
 Na verdade, somos todos responsáveis pela educação sexual. Os educadores, formais ou não, devem se policiar sobre o trabalho que vem sendo feito, pois devemos todos nos preocupar com o desenvolvimento saudável e a qualidade de vida de nossas crianças e adolescentes. 
 Lembrando, sempre, que os objetivos da sexualidade são reprodução, prazer e comunicação. E, acreditar que a educação sexual seja a principal forma de promover mudança de atitude, sendo esta da responsabilidade de todos.
  Podemos assim concluir que a educação sexual é um desafio é que para isto deve haver envolvimento, conhecimento, ética e espontaneidade. E que o educador deve ter claro os valores fundamentais de respeito, amor e saúde. Deve ser acolhedor; saber ouvir; ambientar os questionamentos, ou seja, se certificar qual é o questionamento para não subestimar nem superestimar a criança ou o adolescente; ser neutro quanto a seus próprios valores, para não desconsiderar nem desrespeitar o outro e trabalhar a própria sexualidade.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Sobre erros de grafia

Quase todos acham que cometer erros de grafia é o fim do mundo, um sinal de ignorância. Mas não são erros mais graves do que outros (os contábeis, principalmente). Além disso, em geral, esses erros são excelentes pistas para aprender sobre a língua e sobre o sistema de escrita.
Primeiro, o sistema de escrita: a chamada escrita alfabética não é nem fonética (um símbolo para cada som) nem fonológica (um símbolo para cada fonema). Em uma escrita fonética, “tio” teria tantas grafia quantas fossem as pronúncias ([t] ou [tch] no começo, [o] ou [u] no final, fora os sons intermediários). Uma escrita fonológica implicaria que escrevêssemos /caza/ (ou /kaza/) em vez de “casa” e /sinema/ em vez de “cinema”.
A escrita fonética de “final” seria [final] ou [finau] (ou [finaw]), conforme a pronúncia, mas a fonêmica seria sempre /final/ (como prova o “l” em “finalidade”).
E como escreveríamos “peixe”? Foneticamente, [pexe] ou [peixe] (ou [peyxe] – estou sem um bom símbolo para o som que escrevemos com “x” ou “ch”). Fonemicamente? Hoje, /peixe/. No futuro, quem sabe seja /pexe/.
Crianças aprendendo a escrever, adultos com pouca escolaridade ou prática e cronistas anteriores às leis ortográficas fazem, todos, o mesmo tipo de escolhas. Digamos, para simplificar, que cometem os mesmos tipos de “erros”. Empregam grafias diversas e juntam palavras que os mais experientes (ou os mais recentes) separam.

Mobilidade restrita

Mobilidade restrita

Por Waldir Quadros

Vivemos um momento favorável à formulação e implementação de políticas de qualificação profissional. De um lado, o mercado de trabalho brasileiro foi estimulado pelo crescimento econômico mais expressivo dos últimos anos. De outro, esse dinamismo foi acompanhado de notável mobilidade na base da pirâmide social.
Em relação ao primeiro componente desse cenário promissor, verifica-se que de2004 a2010 o PIB cresceu a uma taxa de 4,4% ao ano. Por sua vez, de2004 a2009 aocupação aumentou 15% e a renda média dos ocupados 22%.
Quanto ao segundo aspecto, são necessárias algumas considerações metodológicas a respeito da forma de estratificação social que adotamos. Em poucas palavras, segmentamos as pessoas ocupadas a partir dos rendimentos declarados no inquérito domiciliar (Pnad) de acordo com “linhas de corte” fixas, como é usual. Entretanto, na delimitação dessas faixas não adotamos nenhum critério estatístico. Ao contrário situamos essas linhas de modo a englobar ocupações que a priori e analiticamente definimos como pertencentes a este ou àquele estrato social.
Para ilustrar, na alta classe média incluímos a alta administração, os micro e pequenos empresários, os profissionais de nível superior e outras ocupações semelhantes. Na média classe média, os gerentes, técnicos especializados, professores do ensino médio etc. Por fim, na baixa classe média (ou “classe C”) encontram-se os professores do ensino fundamental, auxiliares de escritório e de enfermagem, operadores de telemarketing, balconistas, caixas de supermercado etc. No extremo inferior, os miseráveis são aqueles que em 2004 declararam um rendimento de até um salário mínimo. E a massa trabalhadora (pobre) de um a dois.
A tabela abaixo apresenta a evolução da estrutura social entre2003 a2009. Aestrutura social vai até a alta classe média pelo fato de que é muito raro um rico atender o pesquisador neste censo domiciliar.
Nesse período de seis anos, o traço distintivo é a notável redução dos miseráveis e o forte fluxo deles subindo para a situação de pobres e destes ascendendo à baixa classe média remediada. Já a passagem da baixa para a média classe média foi mais restrita. E aqui chegamos ao ponto central desse breve ensaio: o acesso às oportunidades mais bem situadas depende de uma série de fatores, mas a qualificação profissional é um componente fundamental.
No que diz respeito aos jovens da baixa classe média (e também da massa trabalhadora) destacam-se os cursos profissionalizantes de base tecnológica efetiva (“ofícios”), que nos parecem superiores aos de gestão ou afins. Na verdade, a qualificação em gestão (incluindo “empreendedorismo”) deveria ser oferecida em módulo comum a todos os cursos técnicos. E também como reciclagem aos já qualificados.
Como credencial para o ingresso qualificado no mercado de trabalho, ou como aperfeiçoamento, os cursos tecnológicos superam inclusive os cursos superiores de gestão focalizados em áreas muito específicas. Ou generalistas de baixa qualidade.
Por fim, se o ensino técnico de qualidade não deve ser confundido com assistência social, parece oportuna a implementação de uma política de “nivelamento” ou recuperação voltada aos jovens que não conseguem aprovação nos exames de seleção (que devem ser mantidos e ajustados às necessidades dos cursos), em razão de má-formação no Ensino Fundamental. Da mesma forma, justifica-se a adoção de bolsa de estudo aos jovens carentes que viabilizem cursos em tempo integral. O que adicionalmente ajudaria a reduzir a pressão sobre o mercado de trabalho e o desemprego, com seu forte componente juvenil. “Se temos uma refinaria que vai ficar pronta em 2014, já em 2012 temos de fazer a seleção para contratar as pessoas, que estarão aptas até a refinaria ficar pronta”, explica Lairton Correa, gerente de gestão do efetivo da Petrobras. Todas as vezes que a estatal revisa seu plano de investimentos estratégicos, o departamento de recursos humanos acompanha o movimento. Atualmente, a empresa tem 58 mil funcionários. Se forem somados os que trabalham nas subsidiárias, coligadas e no exterior, esse total salta para 80 mil trabalhadores.
Segundo Correa, pelo atual plano estratégico da empresa, há necessidade de contratar 17 mil trabalhadores até 2015. “Isso significa que haverá processos seletivos para atender essa demanda, em todas as áreas”, diz. Ele conta que as profissões mais demandadas são para as áreas de exploração e produção de petróleo, além das competências voltadas para abastecimento. “Dentro desse grupo, o que mais procuramos são engenheiros, de diversas áreas.” Um engenheiro em início de carreira na Petrobras ganha um salário bruto de cerca de 6.200 reais. Porém, se trabalhar em uma plataforma, tem vários adicionais.
A Petrobras tem feito cerca de dois processos seletivos a cada ano. Como seu quadro de cargos e funções é diferente do que existe no mercado, a empresa admite pessoas com formação técnica e em engenharia e complementa as habilidades com cursos dentro da Universidade Petrobras (UP), que tem um volume diário de alunos de mil a 1,5 mil. “Em engenharia de petróleo, por exemplo, não há formação de mão de obra no mercado. Então, abrimos o processo seletivo para qualquer área em engenharia e complementamos a formação do profissional dentro da Petrobras”, conta Correa. O mesmo processo é realizado com os profissionais de nível técnico.
Segundo o gerente do RH da Petrobras, o tempo de formação interna dos profissionais varia de acordo com a função. Em média, são cerca de 18 meses. Um engenheiro da área de petróleo passa por um treinamento de 10 meses após ingressar na empresa. Já um geólogo fica nos bancos escolares por um ano. “Um administrador fica pronto em três meses. Tudo depende da profissão”, acrescenta Correa. No ano passado, a companhia de petróleo investiu 210 milhões de reais em treinamento do seu pessoal. Foram 190 mil pessoas treinadas. Ou seja, cada trabalhador passou por cursos mais de duas vezes no ano.
Preocupada com a falta de profissionais qualificados, a Odebrecht Óleo e Gás criou o Projeto Embarcar, que começa em 2012 e vai dar treinamento para profissionais que vão trabalhar embarcados. A companhia tem três sondas de perfuração no País e mais quatro vão chegar em meados de 2012. Por conta disso, reservou 5 milhões de dólares para dar treinamento aos funcionários dessas sondas somente no ano que vem. “Diante do cenário de gargalo profissional em que nos encontramos, o programa identificou que, se a empresa não investir na formação do trabalhador, a indústria terá um colapso”, afirma Marco Antônio Barbosa, coordenador do projeto. “Ou as empresas qualificam ou terão de importar profissionais.”
Segundo Barbosa, há uma gama ampla de cursos tanto no Brasil como no exterior que devem ser aplicados aos profissionais que trabalham embarcados. “Esses profissionais acabam valendo ouro no mercado. Uma empresa tira o trabalhador da outra. A preocupação hoje é quando eu vou formar e quanto, já que não se pode contratar um profissional sem experiência”, afirma.
O executivo da Odebrecht lembra que a companhia está entrando em uma concorrência para a construção de 21 plataformas em parceria com a Petrobras, o que dá uma dimensão da quantidade de profissionais que serão necessários. Em cada plataforma são cerca de 160 profissionais que trabalham embarcados, divididos em duas turmas, que se revezam de 14 em 14 dias.
Barbosa conta que o Projeto Embarcar tem duas vertentes: a primeira é cuidar dos trabalhadores que já estão na empresa e dar treinamento a eles nos períodos de folga. A segunda é treinar os profissionais que estão no mercado, sem experiência, mas que sejam oriundos de escolas técnicas e universidades que tenham sinergia com a atividade. “O tempo de treinamento depende da área em que o profissional vai trabalhar, mas o básico leva cerca de nove meses”, afirma. A primeira turma do Embarcar, com 98 profissionais, inicia o treinamento no ano que vem.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Mudança lenta, gradual e injusta


Em tese, seria o mecanismo de triagem de candidatos para o Ensino Superior. Mas, em um século de história, o vestibular ganhou significados e peso que ultrapassam esse perfil selecionador, transformando-se em um dos fatores mais determinantes na definição dos currículos do Ensino Médio. Uma relação perigosa, alerta o coordenador da prova da Unicamp, Renato Pedrosa, para quem o fato de o exame ser o único meio de acesso às universidades desvaloriza todo o processo do Ensino Básico. “Ele indica para a comunidade educacional, para a família e para os jovens que a escola pode ajudar, mas não é tão importante quanto a prova final.”
Criado em 1911 pelo ministro da Justiça e Negócios Interiores Rivadávia Corrêa, o vestibular nasceu da Lei Orgânica do Ensino Superior e do Fundamental da República, que tinha como um dos artigos o exame admissional obrigatório para o Ensino Superior. A partir daí, e para cumprir o papel de selecionadora, a prova adotou por anos o modelo de uma maratona de questões de múltipla escolha que exigiam que o estudante dominasse uma quantidade imensa de informações e detalhes sobre todo o conteúdo supostamente aprendido durante o Ensino Médio.
E mais, tentava derrubar candidatos com “pegadinhas”. “Naquele formato, a escola não tinha o know how ou o tempo necessários para preparar o aluno”, afirma Maria Luiza Abaurre, ex-formuladora de questões do vestibular da Unicamp. “Enquanto for a porta de entrada para o Ensino Superior, a escola vai usar o vestibular como parâmetro de formatação de seus currículos”, completa.
Desse descompasso nasceu a indústria dos pré-vestibulares.
Em entrevista a Carta na Escola sobre as recentes mudanças no vestibular da Universidade de São Paulo (USP) – que elevou a nota de corte e diminuiu a proporção de candidatos que passam da primeira para a segunda fase – o coordenador do Anglo, Nelson de Castro, admite que o aluno médio de escola pública está em desvantagem com relação ao de escola particular. “A única coisa para ele é fazer cursinho”, opinou. Mas mesmo tal ajuda extra passa por um filtro socioeconômico. Em São Paulo, o valor da mensalidade flutua na casa dos 600 reais e instituições como o Intergraus chegam a cobrar 4.290 reais.
Injustiça Intrínseca 
A princípio, o cardápio de seleções aplicáveis era variado. No caso da USP, fundada em 1934, cada curso tinha seu método e eram comuns provas discursivas e orais. Ao longo dos últimos cem anos, porém, o exame mudou várias vezes. Em 1968, o MEC determinou que os testes para o Ensino Superior fossem classificatórios, e a nota absoluta do candidato passou a ser irrelevante. Assim, o vestibular perdeu a característica de avaliação do conhecimento, aproximando-se do modelo dos concursos públicos. O formato adotado – testes longos, detalhistas, de múltipla escolha – foi o que acabou moldando os conteúdos ensinados nas escolas.
No Brasil, além disso, o fator socioeconômico acrescenta um elemento de injustiça à fórmula do vestibular. Em todo o País, os 5 milhões de jovens que concluem o Ensino Médio disputarão apenas 300 mil vagas nas universidades públicas. Em São Paulo, só 0,7% das pessoas com Ensino Médio completo e idade entre 16 e 24 anos estão matriculadas em universidades federais, o menor índice do País.
“Apesar de termos observado um esforço nos últimos governos para melhorar a qualidade do ensino, temos de pressupor que o aluno da escola pública não vai disputar em condições de igualdade com o da particular. No processo, pelas características do País, existe um componente de injustiça pressuposto”, analisa Abaurre. Pedrosa concorda: “Sabemos que há candidatos com um potencial muito alto, mas que, por causa da formação em um determinado tipo de escola – por exemplo, uma pública com pouca infraestrutura –, não consegue chegar à prova com o mesmo nível de outro vindo de uma particular”.
No total, 85% de todos os alunos que almejam uma vaga no Ensino Superior vêm do sistema público, mas eles ainda são minoria nos bancos das universidades mais bem conceituadas. Em São Paulo, correspondiam a apenas 8% dos 128 mil inscritos no último vestibular da Fuvest e representaram apenas 25% dos chamados na primeira lista. Para Abaurre, uma prova que levasse em conta essas diferenças seria, sim, mais justa do que outro tipo de processo seletivo, como o sorteio de vagas. “Em princípio, essa aposta tenderia a diminuir um pouco as diferenças que existem entre escolas públicas e particulares. Um pouco. Mas não é possível igualar com um exame as diferenças socioeconômicas.”
Evolução lenta 
Entre as mudanças pelas quais o exame passou na última década, destacam-se iniciativas de grandes universidades que tentam avaliar, além do acúmulo de conteúdo, habilidades e competências como a capacidade de dissertação e argumentação. Mais recentemente, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) despontou como grande selecionador de alunos para os bancos das universidades públicas e particulares. Neste ano, 5,4 milhões de candidatos estão habilitados para fazer a prova. Seguindo a tendência de outras federais, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) anunciou em julho que todas as suas 9 mil vagas serão preenchidas exclusivamente pelo Enem.
Para Abaurre, à medida que o modelo “decoreba” for abandonado em prol de um perfil mais analítico, a tendência é que os cursos preparatórios também se modifiquem. Entretanto, podem perder no confronto com as escolas, que já investem nesse tipo de formação a longo prazo. “A consolidação de um modelo de vestibular equilibrado tende a dificultar a sobrevida dos cursinhos.”
Nos últimos anos, medidas como o vestibular seriado e programas de acesso como o Profis da Unicamp também têm tentado driblar a dinâmica do vestibular tradicional. Na Universidade de Brasília (UnB), a seleção é diluída ao longo do Ensino Médio, com uma prova ao fim de cada ano. Batizada de PAS (Programa de Avaliação Seriada), procura amenizar a quantidade de conteúdo dos testes, que se tornam menos longos e cansativas. Outras instituições, como a Universidade Federal de Sergipe (UFS), também adotaram o projeto.
Além do vestibular seriado, a Unicamp criou no ano passado um programa piloto para incluir os melhores alunos das 96 escolas públicas de Campinas na universidade, sem necessidade de vestibular. Com 120 vagas, o Programa de Formação Interdisciplinar Superior (Profis) seleciona, pelo resultado do Enem, ao menos um aluno de cada instituição de ensino público da cidade. Os escolhidos fazem um curso de dois anos, com aulas de todas as áreas do conhecimento. Ao final do período, todos têm vaga garantida na graduação – aqueles com as melhores notas escolhem primeiro. Os resultados preliminares são animadores: a renda familiar média per capita dos estudantes selecionados é de 492 reais, ante os 1,8 mil reais da população entre 18 e 24 anos com acesso ao Ensino Superior

sábado, 23 de julho de 2011

Educação hoje: Reflexões críticas


Por: ROSALINA ROCHA ARAUJO MORAES
A educação brasileira, que em outros contextos históricos era muito mais precária, hoje apresenta avanços significativos no que diz respeito a fatores como infra-estrutura, formação de professores, material didático, inovações tecnológicas, entre outros aspectos que deveriam favorecer a aprendizagem. Mas, apesar dos investimentos e incentivos, os dados de aprendizagem obtidos através de avaliações como: SAEB SPAECE, ENEM, entre outros, apontam resultados que não condizem com os esforços governamentais e os investimentos feitos na área.
O ensino ofertado em nossas escolas públicas não tem conseguido dar conta dos aspectos mais básicos e primordiais da aprendizagem, como aquisição de leitura e escrita, por exemplo.
É comum ouvir de professores queixas do tipo: os meninos de hoje não lêem, decodificam; os alunos chagam ao final do ensino médio sem compreender o que lêem e sem saber fazer uma redação; o aluno não consegue resolver um problema simples de matemática porque nem entender o problema ele consegue. Ou seja, o aluno não está mais aprendendo a ler e a escrever. Está chegando ao final da Educação Básica com deficiência séria nessa área. Sendo assim, todas as outras áreas do conhecimento ficam comprometidas uma vez que ele nem sabe escrever nem compreende o que lê. Embora pareça determinismo demais falar dessa forma, os dados de desempenho em leitura e escrita apontam para essa conclusão.
Se na Europa, cujo contexto social, econômico e cultural, difere, ao extremo, do nosso, a situação já se mostra preocupante, o que dizer no caso brasileiro? Segundo dados do PISA apresentados por Cecília Braslavsky no texto intitulado Diez factores para uma educación de calidad para todos em El siglo XXI , 13% dos jovens e adolescentes europeus não compreende o que lê. No Brasil os dados são ainda mais inquietantes.
Nesse contexto o município de horizonte inova ao criar dois projetos com foco na leitura e escrita para os anos iniciais do Ensino Fundamental: projeto Lendo Você Fica Sabendo, e Projeto Vivenciando a leitura e a escrita.
Embora consideremos louváveis ações dessa natureza, que visam à melhoria da qualidade educacional, esses projetos apresentam características que nos levam a analisá-los como verdadeiras “camisas de força” para os docentes daquela cidade.
Trabalhando com uma “formação continuada” baseada na instrumentalização e “adestramento” dos professores, a consultoria pedagógica Aprender, responsável pela idealização e execução dos dois projetos limita o trabalho dos professores à aplicação de “receitas prontas” de como executar uma aula. Não cabe mais aos professores, planejar, pensar estratégias para ensinar, enfim, pensar e elaborar sua aula. Cabe-lhes agora executar uma aula que já vem determinada minuto a minuto, como pode ser observado pela análise das rotinas pedagógicas.

Professora Amanda Gurgel se recusa a receber prêmio


A professora Amanda Gurgel, que ficou conhecida após fazer um discurso na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte a respeito da situação da educação no Estado – que resultou num vídeo acessado por mais de um milhão de internautas no YouTube – recusou, no sábado 2, receber um prêmio oferecido em sua homenagem pela associação Pensamento Nacional de Bases Empresariais.
A organização havia dedicado a ela o prêmio 2011 na categoria “educador de valor”. Em sua justificativa, a professora destacou que, “embora exista desde 1994, esta é a primeira vez que esse prêmio é destinado a uma professora”.
“Esse mesmo prêmio foi antes de mim destinado à Fundação Bradesco, à Fundação Victor Civita (editora Abril), ao Canal Futura (mantido pela Rede Globo) e a empresários da educação. Em categorias diferentes também foram agraciadas com ele corporações como Banco Itaú, Embraer, Natura Cosméticos, McDonald’s, Brasil Telecon e Casas Bahia, bem como a políticos tradicionais como Fernando Henrique Cardoso, Pedro Simon, Gabriel Chalita e Marina Silva. A minha luta é muito diferente dessas instituições, empresas e personalidades”, justificou.
Amanda Gurgel, que em seu discurso na Assembleia se queixou do salário que recebe como professora e da situação do sistema de ensino no País, disse que seus projetos são “diametralmente diferentes daqueles que norteiam o PNBE”, grupo mantido por empresários paulistas e, segundo ela, comprometida apenas com “a economia de mercado”, “à mercantilização do ensino e ao modelo empreendedorista”.
Entre as reivindicações da professora, manifestadas em seu site pessoal, estão a valorização do trabalho docente e a elevação para 10% da destinação do Produto Interno Bruto para a educação.
“Não quero que nenhum centavo seja dirigido para organizações que se autodenominam amigas ou parceiras da escola, mas que encaram estas apenas como uma oportunidade de marketing ou, simplesmente, de negócios e desoneração fiscal”, escreveu ela, antes de dizer que não poderia aceitar o prêmio.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Reprovar alunos é contraproducente, diz OCDE

  Reprovação nas escolas não é o melhor caminho para aumentar a produtividade do aluno. Essa é a conclusão de um estudo divulgado nesta quarta-feira pela OCDE, organização que reúne as nações mais desenvolvidas do mundo. De acordo com o levantamento, os países que adotam o sistema de reprovação registram baixo desempenho no Pisa, avaliação internacional capitaneada pela OCDE. Além disso, repetir um aluno custa caro, para o governo e para a sociedade.
Segundo o estudo, na China e Japão, primeiro e oitavo colocados no Pisa, respectivamente, o índice de reprovação é próximo do zero. Por outro lado, em nações como Argentina (58º), Colômbia (52º) e Uruguai (47º), o índice de reprovação está acima dos 30%. No Brasil, a taxa é de 40%, e o país ocupa a 53ª posição entre 65 nações que participam do Pisa.
Além de afetar o desempenho dos estudantes, o sistema de repetência demanda grandes custos para o governo, que precisa pagar os estudos das crianças e jovens reprovados por mais um ano, e para a sociedade, uma vez que os estudantes demoram mais para entrar no mercado de trabalho. Em países como Islândia, o custo monetário é pequeno, cerca de 500 dólares anuais. Mas na Bélgica e Espanha, que registram taxas de reprovação maiores, o custo pode ultrapassar os 11.000 dólares anuais por aluno.
Outra prática apontada pela OCDE como pouco produtiva é a transferência, para outras escolas, dos alunos com baixo desempenho, necessidades especiais de aprendizado ou problemas comportamentais. É uma prática comum na Colômbia e Grécia – ambos tiveram um rendimento abaixo do esperado na última edição do Pisa.
"Uma vez transferidos, os estudantes mantêm menos contato com os antigos colegas, o que afeta seu círculo social. Também, perdem a motivação para os próximos exames", diz o texto do relatório.
O estudo da OCDE acrescenta ainda que, nas escolas onde a transferência não é uma opção comum, os diretores tendem a ser mais responsáveis pelo desempenho de seus alunos. Esses educadores buscam saídas efetivas que interfiram no rendimento dos alunos com dificuldades de aprendizado ou de comportamento.
Alternativas – A discussão sobre os efeitos da reprovação na vida dos estudantes é um tópico antigo na área da pedagogia brasileira. Para aqueles que defendem o fim do mecanismo, uma das alternativas é o que ficou conhecido como progressão continuada. A prática trocou a tradicional aprovação/reprovação anual por ciclos de aprendizagem, que avaliam o estudante, mas não o reprovam – concentrando-se em acompanhar o desenvolvimento de cada aluno para sanar suas dificuldades. O modelo foi adotado há 15 anos no estado de São Paulo e desde então se expandiu a outras unidades da federação.
Formulada a partir de políticas e da realidade europeia, a progressão continuada previa uma avaliação dos estudantes ao fim dos ciclos. Em países como a Grã-Bretanha, onde obteve bons resultados, os ciclos têm duração de apenas dois anos – e não quatro, como no Brasil. Naquele período, os alunos dividem a sala de aula com no máximo 30 colegas – algo incomum nas escola públicas do Brasil. Com um grupo reduzido, o professor pode dar atenção a cada aluno.
No Brasil, a adoção do modelo ainda é controversa – e seus frutos, discutíveis. No último índice de educação feito pela Unesco, braço da Organização das Nações Unidas (ONU) para a educação e a cultura, o país ocupou apenas a 88ª posição entre 128 nações. Por sua vez, dados do Sistema Nacional da Avaliação da Educação Básica (Saeb) relativos ao período 1995-2005, quando a aprovação automática ganhou força, mostram que a qualidade do ensino piorou. Em 1995, a média de proficiência em língua portuguesa dos alunos da quarta série do ensino fundamental era de 188,3 pontos. Em 2005, caiu para 172,3 pontos. Na terceira série do ensino médio os números são mais alarmantes: 290 pontos, em 1995, ante 257,6 pontos.

sábado, 9 de julho de 2011

21. Como lidar com o cyberbullying?



Mesmo virtual, o cyberbulling precisa receber o mesmo cuidado preventivo do bullying e a dimensão dos seus efeitos deve sempre ser abordada para se evitar a agressão na internet. Trabalhar com a ideia de que nem sempre se consegue tirar do ar aquilo que foi para a rede dá à turma a noção de como as piadas ou as provocações não são inofensivas. ''O que chamam de brincadeira pode destruir a vida do outro. É também responsabilidade da escola abrir espaço para se discutir o fenômeno'', afirma Telma Vinha, doutora em Psicologia Educacional e professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Caso o bullying ocorra, é preciso deixar evidente para crianças e adolescentes que eles podem confiar nos adultos que os cercam para contar sobre os casos sem medo de represálias, como a proibição de redes sociais ou celulares, uma vez que terão a certeza de que vão encontrar ajuda. ''Mas, muitas vezes, as crianças não recorrem aos adultos porque acham que o problema só vai piorar com a intervenção punitiva'', explica a especialista.

20. O que é bullying virtual ou cyberbullying?


É o bullying que ocorre em meios eletrônicos, com  mensagens difamatórias ou ameaçadoras circulando por e-mails, sites, blogs (os diários virtuais), redes sociais e celulares. É quase uma extensão do que dizem e fazem na escola, mas com o agravante de que as pessoas envolvidas não estão cara a cara.
Dessa forma, o anonimato pode aumentar a crueldade dos comentários e das ameaças e os efeitos podem ser tão graves ou piores. "O autor, assim como o alvo, tem dificuldade de sair de seu papel e retomar valores esquecidos ou formar novos", explica Luciene Tognetta, doutora em Psicologia Escolar e pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinhas (Unicamp).

Esse tormento que a agressão pela internet faz com que a criança ou o adolescente humilhado não se sinta mais seguro em lugar algum, em momento algum. Marcelo Coutinho, especialista no tema e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), diz que esses estudantes não percebem as armadilhas dos relacionamentos digitais. "Para eles, é tudo real, como se fosse do jeito tradicional, tanto para fazer amigos como para comprar, aprender ou combinar um passeio."

19. Quais são as especificidades para lidar com o bullying na Educação Infantil?


Para evitar o bullying, é preciso que a escola valide os princípios de respeito desde cedo. É comum que as crianças menores briguem com o argumento de não gostar uns dos outros, mas o educador precisa apontar que todos devem ser respeitados, independentemente de se dar bem ou não com uma pessoa, para que essa ideia não persista durante o desenvolvimento da criança.

Quando o bullying ocorre entre os pequenos, o educador deve ajudar o alvo da agressão a lidar com a dor trazida pelo conflito. A indignação faz com que a criança tenha alguma reação. ''Muitas vezes, o professor, em vez de mostrar como resolver a briga com uma conversa, incentiva a paz sem o senso de injustiça, pois o submisso não dá trabalho'', ressalta Telma Vinha, doutora em Psicologia Educacional e professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

18. Bullying na Educação Infantil. É possível?


Sim, se houver a intenção de ferir ou humilhar o colega repetidas vezes. Entre as crianças menores, é comum que as brigas estejam relacionadas às disputas de território, de posse ou de atenção - o que não caracteriza o bullying. No entanto, por exemplo, se uma criança apresentar alguma particularidade, como não conseguir segurar o xixi, e os colegas a segregarem por isso ou darem apelidos para ofendê-la constantemente, trata-se de um caso de bullying.
"Há estudos na Psicologia que afirmam que, por volta dos dois anos de idade, há uma primeira tomada de consciência de 'quem eu sou', separada de outros objetos, como a mãe.
E perto dos 3 anos, as crianças começam a se identificar como um indivíduo diferente do outro, sendo possível que uma criança seja alvo ou vítima de bullying. Essa conduta, porém, será mais frequentes num momento em que houver uma maior relação entre pares, mais cotidiana e estabelecida com os outros'', explica Adriana Ramos, pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do curso de pós-graduação As relações interpessoais na escola e a construção da autonomia moral", da Universidade de Franca (Unifran).

17. O que fazer em casos extremos de bullying?


A primeira ação deve ser mostrar aos envolvidos que a escola não tolera determinado tipo de conduta e por quê. Nesse encontro, deve-se abordar a questão da tolerância ao diferente e do respeito por todos, inclusive com os pais dos alunos envolvidos.

Mais agressões ou ações impulsivas entre os envolvidos podem ser evitadas com espaços para diálogo. Uma conversa individual com cada um funciona como um desabafo e é função do educador mostrar que ninguém está desamparado.
''Os alunos e os pais têm a sensação de impotência e a escola não pode deixá-los abandonados. É mais fácil responsabilizar a família, mas isso não contribui para a resolução de um conflito'', diz Telma Vinha, doutora em Psicologia Educacional e professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A especialista também aponta que a conversa em conjunto, com todos os envolvidos, não pode ser feita em tom de acusação. ''Deve-se pensar em maneiras de mostrar como o alvo do bullying se sente com a agressão e chegar a um acordo em conjunto. E, depois de alguns dias, vale perguntar novamente como está a relação entre os envolvidos'', explica Telma.

É também essencial que o trabalho de conscientização seja feito também com os espectadores do bullying, aqueles que endossam a agressão e os que a assistem passivamente. Sem que a plateia entenda quão nociva a violência pode ser, ela se repetirá em outras ocasiões.

16. Como deve ser uma conversa com os pais dos alunos envolvidos no bullying?


É preciso mediar a conversa e evitar o tom de acusação de ambos os lados. Esse tipo de abordagem não mostra como o outro se sente ao sofrer bullying. Deve ser sinalizado aos pais que alguns comentários simples, que julgam inofensivos e divertidos, são carregados de ideias preconceituosas.
''O ideal é que a questão da reparação da violência passe por um acordo conjunto entre os envolvidos, no qual todos consigam enxergar em que ponto o alvo foi agredido para, assim, restaurar a relação de respeito'' explica Telma Vinha, professora do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Muitas vezes, a escola trata de forma inadequada os casos relatados por pais e alunos, responsabilizando a família pelo problema. É papel dos educadores sempre dialogar com os pais sobre os conflitos - seja o filho alvo ou autor do bullying, pois ambos precisam de ajuda e apoio psicológico.

15. Como lidar com o bullying contra alunos com deficiência?

Conversar abertamente sobre a deficiência é uma ação que deve ser cotidiana na escola. O bullying contra esse público costuma ser estimulado pela falta de conhecimento sobre as deficiências, sejam elas físicas ou intelectuais, e, em boa parte, pelo preconceito trazido de casa. 

De acordo com a psicóloga Sônia Casarin, diretora do S.O.S. Down - Serviço de Orientação sobre Síndrome de Down, em São Paulo, é normal os alunos reagirem negativamente diante de uma situação desconhecida. Cabe ao educador estabelecer limites para essas reações e buscar erradicá-las não pela imposição, mas por meio da conscientização e do esclarecimento.

Não se trata de estabelecer vítimas e culpados quando o assunto é o bullying. Isso só reforça uma situação polarizada e não ajuda em nada a resolução dos conflitos. Melhor do que apenas culpar um aluno e vitimar o outro é desatar os nós da tensão por meio do diálogo. A violência começa em tirar do aluno com deficiência o direito de ser um participante do processo de aprendizagem. É tarefa dos educadores oferecer um ambiente propício para que todos, especialmente os que têm deficiência, se desenvolvam. Com respeito e harmonia.

14. Como agir com os alunos envolvidos em um caso de bullying?


O foco deve se voltar para a recuperação de valores essenciais, como o respeito pelo que o alvo sentiu ao sofrer a violência. A escola não pode legitimar a atuação do autor da agressão nem humilhá-lo ou puni-lo com medidas não relacionadas ao mal causado, como proibi-lo de frequentar o intervalo.

Já o alvo precisa ter a autoestima fortalecida e sentir que está em um lugar seguro para falar sobre o ocorrido. "Às vezes, quando o aluno resolve conversar, não recebe a atenção necessária, pois a escola não acha o problema grave e deixa passar", alerta Aramis Lopes, presidente do Departamento Científico de Segurança da Criança e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Ainda é preciso conscientizar o espectador do bullying, que endossa a ação do autor. ''Trazer para a aula situações hipotéticas, como realizar atividades com trocas de papéis,  são ações que ajudam a conscientizar toda a turma.
A exibição de filmes que retratam o bullying, como ''As melhores coisas do mundo'' (Brasil, 2010), da cineasta Laís Bodanzky, também ajudam no trabalho. A partir do momento em que a escola fala com quem assiste à violência, ele para de aplaudir e o autor perde sua fama'', explica Adriana Ramos, pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do curso de pós-graduação ''As relações interpessoais na escola e a construção da autonomia moral'', da Universidade de Franca (Unifran).

13. O que fazer para evitar o bullying?


A Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência (Abrapia) sugere as seguintes atitudes para um ambiente saudável na escola:
- Conversar com os alunos e escutar atentamente reclamações ou sugestões;
- Estimular os estudantes a informar os casos;
- Reconhecer e valorizar as atitudes da garotada no combate ao problema;
- Criar com os estudantes regras de disciplina para a classe em coerência com o regimento escolar;
- Estimular lideranças positivas entre os alunos, prevenindo futuros casos;
- Interferir diretamente nos grupos, o quanto antes, para quebrar a dinâmica do bullying.
Todo ambiente escolar pode apresentar esse problema. "A escola que afirma não ter bullying ou não sabe o que é ou está negando sua existência", diz o pediatra Lauro Monteiro Filho, fundador da Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência (Abrapia). O primeiro passo é admitir que a escola é um local passível de bullying. Deve-se também informar professores e alunos sobre o que é o problema e deixar claro que o estabelecimento não admitirá a prática.

"A escola não deve ser apenas um local de ensino formal, mas também de formação cidadã, de direitos e deveres, amizade, cooperação e solidariedade. Agir contra o bullying é uma forma barata e eficiente de diminuir a violência entre estudantes e na sociedade", afirma o pediatra.

12. O professor também é alvo de bullying?


Conceitualmente, não, pois, para ser considerada bullying, é necessário que a violência ocorra entre pares, como colegas de classe ou de trabalho. O professor pode, então, sofrer outros tipos de agressão, como injúria ou difamação ou até física, por parte de um ou mais alunos.

Mesmo não sendo entendida como bullying, trata-se de uma situação que exige a reflexão sobre o convívio entre membros da comunidade escolar. Quando as agressões ocorrem, o problema está na escola como um todo. Em uma reunião com todos os educadores, pode-se descobrir se a violência está acontecendo com outras pessoas da equipe para intervir e restabelecer as noções de respeito.

Se for uma questão pontual, com um professor apenas, é necessário refletir sobre a relação entre o docente e o aluno ou a classe. ''O jovem que faz esse tipo de coisa normalmente quer expor uma relação com o professor que não está bem. Existem comunidades na internet, por exemplo, que homenageiam os docentes. Então, se o aluno se sente respeitado pelo professor, qual o motivo de agredi-lo?'', questiona Adriana Ramos, pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do curso de pós-graduação "As relações interpessoais na escola e a construção da autonomia moral", da Universidade de Franca (Unifran).

O professor é uma autoridade na sala de aula, mas essa autoridade só é legitimada com o reconhecimento dos alunos em uma relação de respeito mútua. ''O jovem está em processo de formação e o educador é o adulto do conflito e precisa reagir com dignidade'', afirma Telma Vinha, doutora em Psicologia Educacional e professora da Faculdade de Educação da Unicamp.

11. Qual o papel do professor em conflitos fora da sala de aula?


O professor é um exemplo fundamental de pessoa que não resolve conflitos com a violência. Não adianta, porém, pensar que o bullying só é problema dos educadores quando ocorre do portão para dentro. É papel da escola construir uma comunidade na qual todas as relações são respeitosas.
''Deve-se conscientizar os pais e os alunos sobre os efeitos das agressões fora do ambiente escolar, como na internet, por exemplo'', explica Adriana Ramos, pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do curso de pós-graduação ''As relações interpessoais na escola e a construção da autonomia moral'', da Universidade de Franca (Unifran).
''A intervenção da escola também precisa chegar ao espectador, o agente que aplaude a ação do autor é fundamental para a ocorrência da agressão'', complementa a especialista.

10. O que fazer em sala de aula quando se identifica um caso de bullying?


Ao surgir uma situação em sala, a intervenção deve ser imediata. "Se algo ocorre e o professor se omite ou até mesmo dá uma risadinha por causa de uma piada ou de um comentário, vai pelo caminho errado. Ele deve ser o primeiro a mostrar respeito e dar o exemplo", diz Aramis Lopes Neto, presidente do Departamento Científico de Segurança da Criança e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria.
O professor pode identificar os atores do bullying: autores, espectadores e alvos. Claro que existem as brincadeiras entre colegas no ambiente escolar. Mas é necessário distinguir o limiar entre uma piada aceitável e uma agressão. "Isso não é tão difícil como parece. Basta que o professor se coloque no lugar da vítima. O apelido é engraçado? Mas como eu me sentiria se fosse chamado assim?", orienta o pediatra Lauro Monteiro Filho.

Veja os conselhos dos especialistas Cléo Fante e José Augusto Pedra, autores do livro Bullying Escolar (132 págs., Ed. Artmed, tel; 0800 703 3444):
- Incentivar a solidariedade, a generosidade e o respeito às diferenças por meio de conversas, campanhas de incentivo à paz e à tolerância, trabalhos didáticos, como atividades de cooperação e interpretação de diferentes papéis em um conflito;
- Desenvolver em sala de aula um ambiente favorável à comunicação entre alunos;
- Quando um estudante reclamar de algo ou denunciar o bullying, procurar imediatamente a direção da escola.